quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

2020 - O Ano Pandêmico


Happy New Year 2021 quotes for friends | Business Insider India

Enfim o ano acabou. Sim, o ano em que descobrimos que nossas vidas são tão frágeis quanto nossos egos, e tao limitadas quanto nosso conhecimento. Descobrimos também que nem todos aqueles com quem compartilhamos algum tipo de vínculo compartilham dos mesmos valores e apreço pela vida. Descobrimos também que tolerância e empatia deveria ser matéria obrigatória em todas as escolas, pois está faltando. Por falar em escolas, descobrimos que mais do que nunca, professores são profissionais mais do que essenciais e mais do que sub-valorizados. Se reinventam e fazem o impossivel e o impensável com os recursos discponíveis. Muitas vezes, risíveis. Outra classe de profissionais que se mostraram ainda mais imprescindíveis, e igualmente subestimados são enfermeiros, médicos, pesquisadores de saúde e todos aqueles na linha de frente de cuidados com pacientes direta ou indiretamente atingidos pelo vírus, mas certamente afetados pela pandemia. Psicologicamente, moralmente, financeiramente, inevitavelmente.

Desde Janeiro vivemos e convivemos com a sensação de que nossas vidas estão em risco permanente. Aqui em casa, mudamos nossos hábitos basicos imediatamente, sempre pensando em nos manter vivos, saudáveis, enquanto observamos o mundo lá fora. Tudo era desinfetado, desde nossas mãos e roupas, passando por todas as embalagens de alimentos até as janelas de nosso apartamento, afinal, não sabíamos muito sobre a transmissão pelo ar, e como moramos em andar baixo, melhor prevenir do que remediar, diriam os antigos. 

Digo a todos que as primeiras oito semanas de confinamento, entre janeiro e março, foram cruciais para a contenção do vírus. No condomínio em que moramos existem cerca de 25 torres/blocos numa área relativamente grande, mas sem muitas amenidades. Cerca de cinco mil pessoas moram nesse condomínio, e o movimento de pessoas externas é sempre grande, já que tudo aqui em Shanghai (e na maioria das cidades da China) funciona através de comércio eletrônico e serviços de entrega expressa. Durante essa primeira fase, as entregas foram todas suspensas, exceto alimentos e artigos de primeira necessidade e todas as encomendas eram barradas na entrada principal do condominio, que cona com outras 2 entradas auxiliares, que foram temporariamente fechadas. Quem morasse no complexo tinha que apresentar seu crachá, tirar temperatura e estar usando máscara para poder sair até o local de coleta. Qualquer outra pessoa estranha era barrada. nem mesmo as Ayi (pessoas que trabalhavam nas casas como empregadas) foram permitidas de entrar, pelo menos pelas primeiras 6 semanas. 

 Durante esse período, que incluiu o Ano Novo Chinês, vôos domésticos e internacionais foram interrompidos, viagens de trem canceladas e estradas bloqueadas. Ao final de Fevereiro, todo o stress e nervosismo presente no ar, nas notícias e informações que chegavam de todos os lugares, as conversas com parentes e amigos no Brasil e em outros países, tudo isso começava a pesar. Já eram quase 10 semanas de pandemia, e o apartamento que se tornara também escritório, sala de aula, academia, parquinho e consultório de terapia já tinha visto de tudo, inclusive surtos nervosos de todos os membros da familia. 

Felizmente em Março a temperatura já estava melhor, e podiamos sair de casa, devidamente paramentados com máscaras e alcool gel para aproveitar algumas horas de ar livre. A essa altura, a vida começava a voltar ao normal, transporte público, entregas, restaurantes, abertos com medidas restritivas e protocolos, faltando apenas estabelecimentos com maior concentração de pessoas, como shopping centers, parques e finalmente as escolas. 

Coseguimos aproveitar bons momentos em família, buscando recuperar nosso bem-estar e nossa saúde mental, embora em algumas oportunidades sentimos estar sob olhares suspeitos de alguns locais. Naquele momento, os chineses se encontravam seguros e os estrangeiros que chegavam respondiam pela maioria de casos de infectados, logo eram uma ameaça e embora nós nunca tivessemos deixado a cidade, eles não sabiam e alguns claramente temiam a proximidade. Em um determinado momento um pai chegou a remover seu filho do parquinho quando cheguei com minha filha menor, de 4 anos, para brincar. 

Maio chegou e voltamos as aulas presenciais, após 14 semanas de isolamento e ensino a distância. Protocolos e normas criadas e implementadas, almoço em sala de aula, máscaras, alcoog em gel, transito de corredores organizado, distanciamento, desinfecção de mesas e cadeiras, cancelamento de exames, e fechamos o ano letivo com outra situação reversa porém esperada: formaturas online. Nenhum pai era autorizado a entrar no campus, e nosso novissimo, recém construído auditório não poderia receber mais de 50 pessoas ao mesmo tempo. 

Enquanto isso nosso filho mais velho conseguia voltar finalmente ao Brasil, saindo dos EUA onde estudava e ultimamente morava com uma familia amiga, já que teve que sair do seu dormitório na faculdade, onde o risco era iminente. O contraste entre a vida em Shanghai, uma das cidades mais seguras da China e os EUA e ainda o Brasil, era tão grande que muitos não entendiam (e ainda não entendem) como que nós não precisávamos mais de tantos protocolos e de isolamento. O modo como os governantes de cada lugar trataram sua população e implementaram suas regras e protocolos fizeram a diferença.

A segunda metade do ano tornou isso ainda mais evidente, especialmente com o bloqueio completo dos vôos internacionais. Vimos de perto a batalha que algumas familias brasileiras amigas travaram para reunir membros que estavam separados a meses. Finalmente em Setembro muitos deles retornaram a suas casas e ao convivio de pais e mães isoladas. Infelizmente outros não tiveram tanta sorte, e muitos perderam seus empregos e abandonaram pertences sem poder retornar. 

Em nossa escola, alguns alunos iniciaram o ano ainda com aulas online, e ainda hoje existem alguns que não conseguiram retornar a nossa cidade. felizmente aos poucos os procedimentos restantes estão sendo relaxados e logo em breve teremos alunos e professores circulando normalmente entre nossos prédios e corredores, como a escola deveria ser sempre. 

De fato, nunca mais seremos os mesmos, afinal o que mais tivemos durante esses quase 11 meses de pandemia foram chances de aprender e evoluir, sejam traumáticas as situações ou não. Pessoalmente eu entendi que era necessário encarar essa combinação de fatores para rever valores, reavaliar hábitos e atitudes, desenvlover novas habilidades e reforçar os laços com aqueles que mais importam em nossas vidas. O ano acabou, entretanto não sabemos até quando isso vai durar, portanto é melhor não perder tempo. 

Cuidemo-nos uns dos outros, tenhamos resiliência, resistência e empatia, tudo isso com muito amor próprio e ao próximo, para que todos possamos sair dessa situação vivos. Usemos esse novo ano pare refletir e renovar nossa esperança em uma sociedade mais solidária, responsável e ativa, trabalhando juntos para um futuro melhor. 

Usem máscara! 

Feliz 2021.